o quarto.

- Não sabia o quanto meu quarto era escuro e hoje, olhando pra ele eu percebi isso. Mas não tem a ver com as paredes brancas. Não tem a ver com o guarda-roupa, a sapateira e a cama em marfim, que são até bem claros, e nem com a escrivaninha e a mesa do computador de madeira antiga, não tem a ver com a colcha azul-marinho com beje que reina nesse momento e também não tem a ver com o Ted e o Max em cima da minha cama. Também não tem a ver com o computador preto, o laptop preto e branco ou com a impressora preta e o modem também preto. E nem tem a ver com a mochila jogada ao lado da mesa, e com os meus tênis que, em vez de estarem dentro da sapareira marfim, estão em baixo da escrivaninha.
- Tem a ver com o que está dentro dele, dentro do quarto e só eu sei, só eu vejo, só eu escutei.
- Só eu sei de tudo (e de nada) que aconteceu aqui dentro. E foram tantas coisas e ao mesmo tempo não foram coisas nenhumas. Algumas que valem a pena (e como valem) e outras que eu prefiro nem lembrar que um dia aconteceu. Só eu vejo e só eu sei o que está escrito em pensamentos nas paredes brancas. Cada palavra tatuada nessas linhas imaginarias, que foram escritas com cores e fontes de acordo com a meu estado de espírito no momento em que foram definidas. E muitas dessas palavras eu queria muito apagar das paredes brancas. Só eu ouvi todos os meu gritos. Os felicidades que sempre vinham acompanhados de risadas, os de raiva que era quando pareciam que meu olhos iam saltar de meu rosto e os de tristeza que sempre vinham acompanhados de choro.
- Choro.
- E foram muitos, e ainda são. E talvez sejam os choros que escurecem o meu quarto. Porque são tantos, são tantos os lamentos acoplados em choros que essas paredes brancas, esses móveis claros e os de madeira escura sabem, viram e ouviram. São tantos choros que eu queria que sumissem desse lugar para que, toda vez que eu entrasse no meu quarto, eu não lembrasse de tudo isso.
- Porque eu sei, eu vi e eu ouvi cada palavra, cada risada, cada suspiro que foi dado dentro desse quarto. E sei dos choros, de todo os choros que escuressem esse quarto. O meu quarto escuro.

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